por Isabel Alves, Gastroenterologista na Lifeclinic® - Health care e Chefe de Serviço de Gastroenterologia do Hospital de São Francisco Xavier
A azia e a regurgitação são alguns dos principais sintomas da Doença de Refluxo Gastroesofágico (DRGE). Embora comum, esta doença é ainda pouco conhecida pela população em geral que, por isso, muitas vezes a vê evoluir para estádios mais graves que acartam consigo implicações na qualidade de vida.
Uma afecção crónica O refluxo gastroesofágico define-se como a passagem do conteúdo do estômago para o esófago na ausência de vómitos. Sendo frequente nos períodos após as refeições pode, por vários condicionalismos, ser susceptível de desencadear sintomas e/ou promover lesões da parede do esófago ou mesmo extra esofágicas.
O aumento da prevalência desta DRGE no mundo desenvolvido nos últimos 50 anos é directamente proporcional ao aumento da obesidade e sedentarismo das populações ocidentais. Embora as causas da doença sejam desconhecidas o mecanismo principal é a incompetência da barreira anti-refluxo, sendo os factores mais importantes o relaxamento da passagem do esófago para o estômago por apresentar uma pressão diminuída, por tem tendência a relaxar de forma inadequada ou devido a uma alteração da anatomia dessa zona, como é o caso da Hérnia do Hiato[1].
Os sintomas mais frequentes são a pirose (azia) e a regurgitação. Enquanto a pirose consiste numa sensação de ardor ou queimadura atrás do esterno que pode irradiar ao longo do esófago até ao pescoço, a regurgitação consiste no retorno à boca do conteúdo do estômago sem esforço de vómito. Por vezes, os doentes referem somente sabor ácido ou amargo na boca. A dor com a passagem dos alimentos ou a dificuldade na passagem dos alimentos são outros dois sintomas que podem ser referidos. Menos frequentes são a tosse crónica, a asma, a rouquidão, a dor no peito, a sensação de "bola" no pescoço, ardor na boca e língua. A dor no peito pode-se confundir com a dor de origem cardíaca sendo muito importante excluir esta causa.
Nos doentes com DRGE a modificação do estilo de vida é muito importante e estima-se que 25% das pessoas com sintomatologia podem responder a estas simples medidas. É importante elevar a cabeceira da cama cerca de 10-20cm, evitar dobrar-se particularmente após as refeições, perder o excesso de peso, evitar refeições abundantes e ricas em gordura, não usar vestuário apertado, e não comer 2 horas antes de deitar. Os alimentos que devem ser muito controlados são o chocolate, a menta, os citrinos (laranja e limão), o tomate, as bebidas gaseificadas, o álcool, o café e o tabaco. Existem ainda alguns medicamentos como os anti-inflamatórios e os salicilatos que são prejudiciais.
O procedimento diagnóstico de eleição é a endoscopia que permite diagnosticar a presença ou não de Hérnia do Hiato e se existem ou não lesões da parede do esófago, designadas vulgarmente por Esofagites, possibilitando a colheita de pequenos fragmentos de tecido do esófago para serem analisados ao microscópio, as chamadas Biopsias. Nos doentes em que é mesmo necessário comprovar a existência de refluxo há outros métodos de diagnóstico que são designados por estudos funcionais do esófago entre os quais se encontra a ph-metria das 24 que, através de uma sonda nasal e por um período de 24h, é possível estudar as relações entre os sintomas e os episódios de refluxo avaliando assim a exposição ácida em diferentes períodos do dia e o seu contributo para as lesões do esófago.
O tratamento destina-se a aliviar os sintomas, a cicatrizar as lesões do esófago e a evitar o aparecimento de complicações mais graves que são sobretudo ulcerações, estenose (aperto do esófago), hemorragias e o esófago de Barrett que consiste na substituição do revestimento próprio da parede do esófago por um revestimento de tipo do estômago e intestino.
Se não tratada, a doença de refluxo pode ainda conduzir a complicações mais graves, entre as quais a mais temida, embora de baixa incidência, o cancro do esófago. Assim para além das medidas gerais o tratamento é conseguido com fármacos que inibem a secreção ácida do estômago (omeprazole, lanzoprazole, pantoprazole) podendo adicionar-se fármacos procinéticos que vão exercer a sua acção sobre a motilidade do esófago e do estômago (domperidona). Todos estes fármacos possuem excelentes perfis de segurança a curto e longo prazo. Nos casos de fracasso do tratamento médico e em doentes seleccionados existe actualmente um grupo de novas tecnologias promissoras, as terapêuticas endoscópicas, bem como a cirurgia por via laparoscópica que tentam reforçar a barreira antirefluxo através de vários métodos.
[1] O que é a Hérnia do Hiato? O diafragma é um músculo que separa os órgãos que estão alojados no tórax dos órgãos que se localizam no abdómen. A zona de união entre o esófago e o estômago, o esfíncter esofágico inferior fica ao nível do diafragma. O estômago normalmente está abaixo do diafragma mas, por vezes, uma parte dele passa através do diafragma e fica no tórax. É a esta parte do estômago que sobe e fica em posição anormal que se chama hérnia do hiato. Muitas vezes a hérnia do hiato associa-se à doença do refluxo.
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Este artigo foi publicado na Revista BOA SAÚDE - O seu guia do bem estar, nº 3 de dezembro.
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